domingo, 20 de setembro de 2009

Place de la Concorde, Paris

Há muito tempo não posto nada aqui... Confesso que por um misto de preguiça e falta de tempo. Não que agora ele esteja sobrando, muito pelo contrário. Eu tenho um sério problema com o tiozinho Chronos: quanto mais tarefas, com prazos prestes a vencer, vão se acumulando, mais eu tenho vontade de dispersar e fazer outras coisas (legais) que não têm nada a ver. Então vou escrever um post só pra comentar algumas impressões sobre minha última viagem, enquanto ainda estão "fresquinhas", pois cheguei há uma semana... Dessa vez estive em Paris e Budapest e, aos poucos, irei postando sobre tudo que vi e revi...
Hoje queria falar um pouco sobre a Place de la Concorde, um lugar que todo mundo visita e acha o máximo. Eu não acho tudo isso, primeiro porque é uma mistura de estilos que me incomoda: aquele obelisco egípcio, as luminárias verde e dourado, as estátuas, o chafariz, a torre Eiffel ao fundo, a avenida barulhenta e cheia de carros, os prédios em volta - não acho harmonioso como outros lugares. Cada item em separado, tirando a avenida de concreto e os carros, claro, é bonito, mas juntos não combinam...



Aliás, acho que Paris é como Buenos Aires - uma cidade bonita, cheia de lugares lindos e coisas legais pra fazer, mas... Mas, a falta de educação, o mau-humor, o azedume e a mania de andar com um cigarro entre os dedos jogando fumaça na cara das pessoas do parisiense (e do argentino) irritam profundamente e derrubam o conceito que a gente faz desses locais. Não sei como em cidades turísticas podem receber tão mal as pessoas, a tal ponto que, sinceramente, não fosse pela beleza (um pouco empanada pela sujeira e o mal cheiro dos transeuntes, no caso de Paris), os locais históricos e o Louvre, eu não voltava nunca mais. E, justamente por causa disso, Paris está em terceiro lugar, na minha opinião, entre as cidades que mais gosto da Europa, perde pra Praga e Lisboa...
Voltando ao assunto... Acho que a maioria das pessoas que passa pela Place de la Concorde e tira milhões de fotos - especialmente os milhares de japinhas (ô gente pora gostar de tirar foto!) - não faz idéia de que ali foi guilhotinada Marie-Antoinette (Maria Antonieta pra nós, tupiniquins) em 16 de outubro de 1793...


Marie-Antoinette aos 14 anos (pintura de Joseph Ducreux) e por volta dos 25 anos (pintura de Elisabeth Vigée Lebrun).

Não conheço tanto sobre a vida dela, aliás estou lendo um livrinho da Evelyne Lever que comprei na lojinha do Musée de l'Armée sobre ela. Confesso que comprei mais pelas ilustrações, que são lindas: tem um monte de retratos dela pintados pela Elisabeth Vigée-Lebrun (que particularmente adoro), gravuras, charges, documentos da época, etc. Mas, de qualquer forma, acho que ela não era má pessoa, era apenas uma mulher fútil e leviana, como tantas de sua época (e de outras, inclusive rainhas). Isso não faz dela uma criminosa ou alguém que merecesse morrer desta forma, especialmente vil para uma personagem da mais alta nobreza européia. Esse tipo de coisa é que eu não aceito - não bastava que ela e o marido fossem depostos? Pra que guilhotiná-los? O mesmo sinto em relação à família Romanov da Rússia - não me conformo com tanta violência, especialmente contra a Tsarina* e as crianças.

(*) Existe muita controvérsia sobre a grafia correta desta palavra, se seria Tzar, Tsar ou Czar. No Brasil, constam dos dicionários as três formas. Ao que parece, o correto seria "Tsar". No alfabeto cirílico escreve-se "царь". A letra "ц" pronuncia-se "tz", o "a" tem pronúncia igual à nossa, o "p" é como se fosse "r" e o "ь" não tem som.


Marie-Antoinette mais velha: sozinha (1778) e com os filhos (1787) em pinturas de Elisabeth Vigée-Lebrun.

O fato é que, sentei por uns minutos pra descansar as pernas e dar um refresco para meus pezinhos inchados, aos pés daquela estátua perto do portão, encimado pelos cavalinhos, que dá pras Tuileries, e que acho que representa a cidade de Strasbourg... E imediatamente me veio à mente uma gravura de David (outro pintor que simplesmente amo!), pintada in situ, que retrata os últimos momentos de Marie-Antoinette sobre o patíbulo, antes de ser guilhotinada. Pelo desenho, um dos cavalinhos alados (montado por Mercúrio ou pela Fama), que hoje ficam no portão, ficava ali em frente à uma estátua (com uma lança e um globo terrestre na mão)e dá pra ver, ainda, os prédios ao fundo, sem a Madeleine (que hoje fica entre eles), pois ela foi construída somente na época de Napoleão. Não achei essa gravura e acabei postando outras duas aqui. A estátua vista nelas é diferente das que existem na Place de la Concorde hoje - inclusive acho que estas estátuas foram colocadas ali somente por volta de 1830 - ela se parece bastante com uma que fica no início da Ponte Alexandre III... Deve ser uma das estátuas que ficavam em torno da estátua de Louis XV (localizada no centro da praça e destruída durante a Revolução) e que simbolizavam as "virtudes" do rei: a Força, a Justiça, a Prudência e a Paz.
Essa praça foi construída durante o reinado de Louis XV, avô do XVI, entre 1758 e 1772, e remodelada várias vezes, principalmente depois de 1830 (quando ganhou a "cara" que tem hoje - o obelisco egípcio é dessa época e foi um presente do vice-rei do Egito). Em 30 de maio de 1770, ocorreu uma tragédia que prenunciava que aquele não seria um lugar "auspicioso": durante um espetáculo de fogos de artifício, em honra ao casamento do então Delfim, futuro Louis XVI, com Marie-Antoinette, 133 pessoas morreram, pisoteadas e/ou sufocadas, por conta do pânico provocado por um incêndio devido à queda de um foguete...



Gravuras mostrando a execução de Marie-Antoinette em 1793 na praça que hoje chama-se Place de la Concorde.

Fiquei pensando na turba ensandecida gritando impropérios e palavras de (des)ordem para a pobre coitada... Sei lá, me deu um aperto no coração... Posso imaginar (e somente imaginar) o que essa mulher passou naquele dia. Ela não tinha nem quarenta anos ainda - e certamente devia parecer bem mais velha (porque naqueles tempos o povo "se acabava" cedo) - e morrer assim... Dizem que ela não imaginava que fosse ser condenada à pena capital e que, até o momento final do julgamento, achava que seria deportada. E parece que o conde de Fersen (Hans Axel von Fersen, 1755-1810) , um sueco com quem ela manteve um caso por vários anos, fez de tudo para salvá-la mas não conseguiu. Anos depois, ele morreu assassinado por um marinheiro que, sei lá por que motivo, pulou com os dois pés sobre o peito do "pobre" ricaço, quebrando-lhe as costelas.


Retratos do Conde de Fersen e de Louis XVI (na época do casamento com Marie-Antoinette).

Louis XVI foi guilhotinado em janeiro de 1793 e ela só foi morta em outubro. Imaginem o que deve ter passado pela cabeça dela esse tempo todo, sem contar que estava presa desde 1789. Tiraram-lhe o filho, o Delfim (Louis XVII, 1785-1795), um garoto de 8 anos, foi transferida pra sombria Conciergerie (eu passei em frente a essa prisão várias vezes - tem um clima sinistro e pesadérrimo) e, ainda por cima estava com tuberculose e câncer no útero, sofrendo constantes hemorragias! É impossível não sentir pena da pobrezinha...


Uma das últimas imagens de Marie-Antoinette (1791) e de seu filho, o Delfim (1792), aos 7 anos. Pinturas de Alexandre Kucharsky.


Talvez a vida de Marie-Antoinette (nascida Maria Antonia Josepha Johanna von Habsburg-Lothringen, em 2 de novembro de 1755 em Viena) na corte francesa não tenha sido esse "mar de rosas" que todo mundo pensa. Afinal ela se casou com o bobalhão do Louis XVI aos 14 anos (ele tinha 15 ou 16) e, pelo simples fato de ser estrangeira (austríaca), sempre foi vista com desconfiança pelos franceses. Além disso, ao que parece, não foi bem recebida pela família do marido, especialmente pelas irmãs mais velhas dele, porque a mais nova, Elisabeth, acabou se tornando sua amiga. O marido era um esquisitão, meio abobalhado; a galera frequentadora do palácio de Versailles devia tramar horrores contra ela, inventar mil e uma fofocas; a mãe era uma dominadora e marcava em cima, pentelhava o tempo todo. Pelo visto, o único que a compreendia era o tal do conde de Fersen, que a conheceu aos 18 anos (os dois eram da mesma idade), e dizem que era lindo (mas pelo retrato me parece bem "caidinho")...
Tudo isso me faz pensar e, por essas e outras - a maior galera morreu guilhotinada ali: Louis XVI, Danton, Robespierre, Charlotte Corday, Philippe de Orléans, Lavoisier, etc. - a tal Place de la Concorde não me parece um lugar muito "auspicioso", trazendo à tona sentimentos bem ruins e memórias nefastas de acontecimentos vergonhosos da História recente da humanidade...

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Mata Hari




Quando criança eu adorava ler sobre Mata Hari e ficava imaginando uma dançarina-espiã misteriosa, coberta com um monte de véus coloridos e penduricalhos dourados, os olhos cheios de delineador preto, circulando em meio às grandes personalidades da Europa, participando de intrigas, planos malucos de conquista do mundo, envenenamentos, mortes suspeitas, etc. Uma 007 em tons de sépia, envolta em fumaça difusa e aromas de incenso... Mas depois que a gente cresce muita coisa perde o brilho, o glamour...
Um dia, pesquisando na net, encontrei várias fotos dela e achei-a gorducha, sem-sal e sem-graça, com um rosto esquisito. Entretanto, o interesse pela história ímpar, misteriosa e intrigante, permaneceu e acho que é o que vai perdurar pra sempre...
Seu nome verdadeiro era Marguerite Gertrude Zelle e ela nasceu na Holanda em 1876, filha de um próspero comerciante de origem javanesa com uma holandesa. Em 1895 ela se casou com um tal de McLeod, capitão do exército. Sei não, holandês com esse nome?! Vai ver que era o Highlander, o guerreiro imortal (Connor ou Duncan?)... Logo depois ele foi transferido para o Oriente e eles tiveram que se mudar pra Java com o filho pequeno (que acabou sendo assassinado pela empregada quando tinha 3 anos - por que motivo???). Mais tarde, eles tiveram também uma filha. Ao que parece o capitão-highlander era mulherengo, pinguço e brutamontes - e a pobre da Marguerite sofreu um bocado nas mãos dele. Depois de muita briga e baixaria, eles acabaram se separando.
Ela foi viver em Paris e tornou-se amante de um ricaço, que a enchia de presentes, mas que acabou sendo preso por emitir cheques sem fundo (pra bancar os luxos da bonitona, claro)... Coitado... De novo na pindaíba, ela teve que dar um jeito de se sustentar... Foi aí que criou sua "personagem" Mata Hari, uma dançarina exótica indiana, que rapidamente caiu no gosto do público e passou a viajar pela Europa, com apresentações disputadíssimas em vários teatros.
Após o início da Primeira Guerra, passou a ser vigiada pelos serviços secretos da França e da Inglaterra, por conta de suas "ligações perigosas" com altos oficiais e políticos, tanto alemães quanto aliados - o que despertou a suspeita de que poderia ser uma agente dupla. Acabou sendo presa em 1917, em Paris, sob a acusação de espionagem. Embora houvesse rebatido todas as acusações contra ela e nenhuma delas estivesse amparada por provas concretas, foi condenada ao pelotão de fuzilamento. Nessas horas é que me pergunto onde estavam todos os caras com quem se relacionou, por que nenhum deles intercedeu por ela?
Na manhã de 15 de outubro de 1917, ela foi levada para Vincennes, acompanhada somente pela irmã Léonide. Recusando-se a vendar os olhos, deu o último adeus à irmã e foi executada pelo pelotão de fuzilamento, composto por doze homens, com duas salvas de tiros. Após a confirmação de sua morte por um médico, seu corpo inerte foi entregue à faculdade de medicina para ser dissecado...


Pelotão de fuzilamento de Mata Hari.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

As desventuras de Maximiliano e Charlotte



Maximiliano Habsburgo e Charlotte da Bélgica.

A princesa Charlotte da Bélgica (1840-1927) era filha do rei Leopoldo I (1790–1865) com sua segunda esposa, Louise-Marie da França (1812–1850). Ela recebeu este nome em homenagem à primeira esposa do pai, Charlotte de Gales. Era a neta preferida da rainha da França, Marie Amélie das Duas Sicílias (esposa de Luís Filipe) que foi também sua grande amiga e confidente. Charlotte perdeu a mãe, vítima de tuberculose, quando tinha apenas 10 anos, ficando aos cuidados de uma amiga da família, a condessa de Hulste. Em 1857, ela se casou com seu primo Maximiliano (1832-1867), arquiduque da Áustria.



Rei Leopoldo I da Bélgica com a esposa, Charlotte e os dois filhos.


Retratos de Charlotte quando pequena e adolescente.

Max era filho do arquiduque Franz Karl e da princesa da Bavária, Sophia Frederica, e, por conseguinte, irmão do imperador Franz Joseph (que era casado com minha "ídola" Sissi). Essa Sophia Frederica devia ser uma daquelas velhas insuportáveis e infernizou a vida da pobre coitada da Sissi o quanto pôde. Entretanto, desde o início, ela simpatizou bastante com Charlotte. Ao que parece, ela tinha o hábito de fazer comentariozinhos irônicos comparando suas duas noras, deixando claro que Charlotte era uma princesa e tinha sido educada para tal, ao contrário de Sissi. Talvez esse tenha sido um dos motivos que fizeram com que Charlotte e Sissi se "estranhassem" de vez em quando. Outro fato que contribuiu para estabelecer um clima ruim entre as duas foi a amizade e as afinidades existentes entre Sissi e Maximiliano, que eram amantes das artes e ciências em geral - o que deve ter enciumado bastante Charlotte. Segundo os fofoqueiros de plantão da época, Maximiliano seria filho bastardo de Sophia Frederica com Napoleão II e ela nunca teria se recuperado da morte deste último. Será?!
Agora vem a parte mirabolante da história...
A milhares de quilômetros de Viena, no México, estava rolando a maior confusão entre monarquistas e republicanos que culminou com uma intervenção da França no país. Vai entender o que se passava na cabeça do imperador da França, Napoleão III (casado com Eugénie de Montijo), pra se envolver numa empreitada dessas. E, o pior, o que se passava na cabeça do Max pra aceitar ser, digamos, "laranja" do imperador da França e proclamar-se "imperador do México"! E dizem que foi a Charlotte quem encheu a cabeça de Max pra aceitar, já que para isso ele teria que renunciar aos seus direitos ao trono da Áustria. E bem que a avó dela, Marie Amélie, foi contra, antevendo que essa aventura rocambolesca ia terminar muito mal...
E os EUA, não fizeram nada? Pois é, quando isso aconteceu (1863-64) eles estavam ocupados com a Guerra de Secessão... Max e Charlotte mudaram-se "de mala e cuia" para o México e foram coroados em 1864. Mas - agora é o momento de levantar aquele cartazinho escrito "EU JÁ SABIA!" - alguns meses depois, Napoleão III mandou retirar todas as tropas francesas do México e nosso querido e aventureiro casal ficou entregue à própria (má) sorte. O negócio piorou quando acabou a Guerra de Secessão e os EUA estabeleceram um bloqueio, que impedia o envio de reforços para Max, e, ainda por cima, passaram a fornecer armamento para os republicanos...
Charlotte entrou em pânico e pegou o primeiro navio pra Europa a fim de conseguir auxílio para seu marido. Se fosse eu teria arrumado minhas trouxinhas e voltado pra Bélgica bem rápido...Em Paris, Napoleão III descaradamente recusou-se a recebê-la e, depois de muita insistência, disse que não podia ajudar Maximiliano. Em Viena ela também não conseguiu nada e, finalmente, seguiu para Roma na tentativa de que o Papa Pio IX intercedesse por eles. Lá ela teve uma crise nervosa ou coisa parecida (deve ter quebrado tudo, sei lá...aqueles tapetes e vasos caros, um montão de obras de arte...xiii) e o Papa acabou tendo que hospedá-la no próprio vaticano...
Enquanto isso, no México...
Max que era muito idealista (ou tonto mesmo) recusou-se a fugir e decidiu enfrentar o cerco dos republicanos, liderados por Benito Juarez, com a meia dúzia de homens que havia sobrado. Acabou sendo capturado em maio de 1867, sendo sumariamente julgado e condenado à pena de morte! Não foi por falta de aviso, né?!Apesar dos muitos telegramas (?!) de monarcas europeus e figuras proeminentes como Victor Hugo (o famoso escritor, autor de "Os miseráveis") e Giuseppe Garibaldi (aquele mesmo, que casou com a Anita) que foram enviados ao México pedindo pela vida de Max, o tal do Juarez não cedeu. Eu, particularmente, achei muita baixeza desse cara, pequenez de espírito, bem se vê que não era um gentleman, não tinha um pingo de civilidade. Se fosse Júlio César certamente teria liberado o cara, como ele fez tantas vezes...Mas o cara era um daqueles populistas revoltados que adoram aparecer pra mídia e fazer uma moral com os descamisados "afirmando a soberania" de seus países...
O fato é que Maximiliano acabou sendo executado por um pelotão de fuzilamento em 19 de junho de 1867 em Cerro de las Campanas. Coitado... E Charlotte, que ainda estava na Europa procurando ajuda para o marido, enlouqueceu de vez e passou o resto de sua vida trancafiada em castelos - primeiro no Castelo de Miramare (entre 1866-67) em Trieste e, depois, no Castelo de Bouchout na Bélgica. Ela morreu em 19 de janeiro de 1927...




"Execução do imperador Maximiliano" (1867). Edouard Manet.